Comunicação animale (ups) animal!
Tal como neste título, os animais por vezes enganam-se ao comunicar. Um estudo publicado recentemente pela prestigiada revista The American Naturalist, com a participação dos investigadores do CIBIO-InBIO André C. Ferreira e Gonçalo C. Cardoso, mostra que esses “erros” são informativos, e podem ser usados por outros animais para decidir sobre, por exemplo, com quem acasalar.
Cantar para seduzir
Na primavera, estamos habituados a reparar numa multidão de passarinhos que começa a cantar. O quadro parece bucólico, mas deve-se ao facto de estas aves (geralmente os machos) estarem a convencer outras a acasalar. Como tal, o canto de muitas espécies é longo e elaborado, para mostrar habilidade e boa condição física. Mas há muitas espécies de pássaros que têm canções simples, que são difíceis de explicar no contexto de mostrar habilidade e impressionar os ouvintes.
Por exemplo, o “junco-de-olho-escuro”, um pardal norte-americano estudado por investigadores do CIBIO-Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos/InBIO Laboratório Associado, Universidade do Porto em colaboração com colegas da Universidade de Indiana, tem canções muito simples: apenas uma sílaba repetida durante cerca de segundo e meio. Tentativas de relacionar estas canções com a qualidade, a experiência ou o sucesso reprodutor dos juncos têm falhado.
Quando menos é mais
Num estudo recentemente publicado pela revista científica The American Naturalist, André C. Ferreira e Gonçalo C. Cardoso, investigadores do CIBIO-InBIO e os seus colegas, mostram que, talvez por engano, os juncos por vezes deixam incompleta uma sílaba, começam a alternar em vez de repetir sílabas, etc. Segundo André C. Ferreira, «estes “erros” são raros, mas serão notórios para aves que convivem todo o dia». Os investigadores descobriram que cantar com poucos “erros” reflecte aspectos da qualidade dos machos, como a sua idade e experiência. «E machos que cantam menos “erros” fertilizam mais ovos (no seu ninho e no dos vizinhos!), o que sugere que as fêmeas prestam atenção a estes deslizes ao tomarem as suas decisões de acasalamento», explica André.
«A descoberta de que “erros” de comunicação indicam a qualidade dos indivíduos ajuda a explicar porque é que muitas espécies têm sinais sexuais simples», nota Gonçalo C. Cardoso. «Como os erros são mais fáceis de detectar em sinais simples e repetitivos, os indivíduos podem beneficiar ao usar esses sinais para mostrar claramente que não cometem erros», acrescenta Gonçalo. É, portanto, na ausência de erros que reside a indicação de habilidade.
Os resultados deste estudo contribuem para uma melhor compreensão do funcionamento da comunicação animal, especificamente em espécies com mensagens simples e repetitivas.
Artigo original:
Ferreira AC, Atwell JW, Whittaker DJ, Ketterson ED, Cardoso GC (2016) Communication Value of Mistakes in Dark-Eyed Junco Song. The American Naturalist. DOI: 10.1086/687520.
Imagens
Um junco-de-olho-escuro a cantar. Fotografia de David Levinson.