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Estudo pioneiro revela as origens dos bovinos taurinos do norte da África

Estudo pioneiro revela as origens dos bovinos taurinos do norte da África
Um estudo liderado pelo grupo de investigação em Arqueogenética do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (BIOPOLIS-CIBIO) da Universidade do Porto e realizado em colaboração com o Centro e Paleogenética da Universidade de Estocolmo, permitiu sequenciar os primeiros genomas de quatro bovinos Africanos da Idade do Ferro (>2500 anos) e revelar que o ancestral selvagem – o auroque Africano – contribuiu para os genomas de bovinos domésticos do Magreb, na Tunísia.

A questão da eventual existência de um processo de domesticação de bovinos no Norte de África é amplamente debatida pela comunidade científica, entre arqueólogos e geneticistas. Os bovinos que hoje existem na região do Noroeste Africano – de cornos longos - pertencem ao grupo taurino, mas são distintos dos seus congéneres Europeus. E, ao contrário da maioria dos bovinos que se encontram distribuídos pela quase totalidade do continente Africano, não revelam influência do denominado gado zebu oriundo da India (bovinos com bossa).

Este estudo, publicado recentemente na revista  iScience, vem demonstrar que há mais de 2500 anos, na Idade do Ferro, no reino da Numídia, a comunidade agropastoril que habitava esta região do interior norte da Tunísia que faz fronteira com a Argélia – província de El Kef – criava bovinos domésticos cujos genomas nucleares (que contêm informação de ambos os progenitores) têm afinidade com o do único auroque pré-doméstico (com aproximadamente 9000 anos) para o qual existe informação genómica e do ADN materno (mitocondrial).

"Os resultados revelam ainda a partilha de linhas maternas entre este auroque e os bovinos da Idade do Ferro o que confirma o cruzamento entre fêmeas selvagens e os seus derivados domésticos, pois o ADN mitocondrial é transmitido pela via materna – ou seja, de mães para filhas e filhos” refere Catarina Ginja, primeira autora do estudo e líder do grupo de Arqueogenética no BIOPOLIS-CIBIO. "Não é possível saber com certeza se este terá sido um recrutamento intencional ou um cruzamento acidental entre populações selvagens e domésticas” acrescenta a mesma investigadora.

Neste estudo foram utilizados protocolos otimizados para extração de ADN de restos arqueológicos muito degradados. A sequenciação de última geração permite analisar fragmentos curtos dos genomas destes animais (<80 pares de bases) e validar os resultados através da identificação dos padrões de degradação – apesar dos desafios que o ADN antigo coloca, tirou-se partido dos processos de degradação para diferenciar o ADN endógeno dos bovinos da Idade do Ferro de fontes de contaminação atuais. Os resultados foram interpretados por uma equipa multidisciplinar que incluiu arqueólogos, zooarqueólogos, geneticistas e bioinformáticos.

"Os bovinos taurinos do norte de África e de regiões do Sul da Europa, como a Ibéria, contêm elevada diversidade genética. Estão extremamente bem-adaptados a climas quentes e áridos e a identificação de variantes genéticas ancestrais associadas aos processos de adaptação e seleção podem contribuir para a manutenção de biodiversidade essencial para lidar com o impacto das alterações climáticas em curso. Revela-se essencial preservar esta diversidade ancestral, já perdida em raças comerciais sujeitas a seleção intensiva” destaca ainda Catarina Ginja.

O grupo de Arqueogenética do BIOPOLIS-CIBIO está a investigar também as origens e trajetórias evolutivas dos bovinos Ibéricos, nomeadamente para tentar entender em que medida a elevada diversidade genética que observamos no gado autóctone resulta de hibridação, isto é cruzamento, com os auroques que outrora existiram nesta região. Já foram sequenciados genomas de auroques do neolítico e do calcolítico (com mais de 5000 anos) que vão fornecer informação-chave sobre este assunto. Os bovinos autóctones, como por exemplo a raça Barrosã partilham variantes genéticas com bovinos taurinos do norte de África e será interessante  perceber os processos de dispersão do gado doméstico pela bacia do Mediterrâneo e as trocas com o norte de África – só a partir do ADN antigo se poderá datar quando aconteceram e a que culturas poderão estar associadas.

Artigo original: 
Ginja, C., Guimarães, S., da Fonseca, R. R., Rasteiro, R., Rodríguez-Varela, R., Simões, L. G., Sarmento, C., Belarte, M. C., Kallala, N., Torres, J. R., Sanmartí, J., Arruda, A. M., Detry, C., Davis, S., Matos, J., Götherström, A., Pires, A. E., & Valenzuela-Lamas, S. (2023). Iron age genomic data from Althiburos – Tunisia renew the debate on the origins of African taurine cattle. iScience, 26(7), 107196. 

Imagens:
Imagem 1. Material arqueológico: chifre de um bovino doméstico | Créditos de imagem: Paulo Gaspar Ferreira 
Imagem 2. Material arqueológico: molares de auroque | Créditos de imagem: @ Paulo Gaspar Ferreira

2023-07-26
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